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A mediação é uma ferramenta extremamente útil para tratar diversos tipos de conflitos. Um deles é o surgido entre advogados sócios em escritórios de advocacia.
É comum, sobretudo em grandes bancas, a saída repentina de advogados, o que frequentemente ocorre de forma não amistosa.
Também em escritórios de porte menor, constituídos por sócios que muitas vezes são amigos de longa data e que, justamente por isso, optaram por empreender esforços profissionais de forma conjunta, a desavença costuma ocorrer e a sociedade pode terminar de forma desastrosa.
Quando isso acontece, a escolha do caminho litigioso para solucionar pendências como o pagamento de haveres é quase automática.
Todavia, tanto o processo judicial como a arbitragem são formatos no qual a beligerância impera e a decisão é imposta por um terceiro que não os próprios ex-sócios.
Decorrência disso é uma batalha judicial – ou arbitral – que trará a todos um enorme desgaste financeiro e emocional. A harmonia dos anos iniciais se converte em guerra na qual os litigantes, até por estarem em seu habitat quase natural, irão empreender todos os esforços para minar e liquidar o antigo sócio. Se o bom advogado se empenha normalmente na defesa processual de seus clientes, fará o possível e o impossível para “vencer” o seu próprio caso.
O paradoxo é que em muitas situações ambos os lados querem, genuinamente, solucionar o problema de forma consensual, sem briga, mas não conseguem fazê-lo. A emoção envolvida na situação impede qualquer tipo de comunicação racional em direção ao acordo.
Como pontua o mediador americano Joseph Folger, pessoas em conflito encontram-se frágeis, confusas, inseguras e autocentradas. Isso as torna cada vez mais fechadas e sem possibilidade de enxergar pontos de vista alheios, o que atrapalha o entendimento. Está também provado que a emoção atua de forma seletiva, fazendo com que a pessoa deixe de perceber possíveis saídas para o problema no qual está inserida.
Some-se a isso o fato de que o processo litigioso acaba aumentando o conflito. Quanto mais uma parte apresenta seus argumentos, mais a outra os rebate, o que obriga a primeira a não só reafirmar o ponto de vista que expôs, mas também a encontrar novos argumentos para defender sua posição inicial. O conflito escala! E isso se torna um círculo vicioso que se retroalimenta, dificultando a percepção de possíveis alternativas.
O processo litigioso impede, ainda, que os motivos subjacentes ao conflito venham à tona e sejam abordados, o que inviabiliza o debate sobre as verdadeiras causas do problema.
Um dos pontos mais importantes da mediação, e comum a todas as escolas que estudam o tema, é a concepção de que o conflito aparente contém também aspectos ocultos. Uma coisa é o pedido judicial levado ao julgador, outra são os reais motivos que conduziram à discórdia.
Ao longo do relacionamento entre sócios é natural que muitas divergências surjam. Mas isso, se não trabalhado, se não conversado, pode gerar um acúmulo de descontentamentos que irá eclodir mais à frente e conduzirá a uma situação de rompimento. Pequenas retaliações cotidianas, ausência de reconhecimento, decisões unilaterais, entre outras práticas, podem levar a uma situação futura de conflito. Para complicar o quadro, num relacionamento prolongado e conturbado o diálogo normalmente é interrompido ou passa a ter péssima qualidade, de forma que as causas da discordância acabam sendo mascaradas e as próprias partes não sabem mais porque estão brigando.
A abordagem do Judiciário nesses casos não tem o desejável alcance aprofundado. Ao Juiz é até mesmo vedado imiscuir-se nos aspectos ocultos do conflito. A análise se limitará ao que tiver sido apresentado pelas partes. Mas, como se disse, nem mesmo elas conseguem ao certo perceber de forma ampla e segura o que está ocorrendo.
Nesse sentido, quando a sentença é proferida resolverá o processo, mas não o conflito, o que acarretará no não cumprimento espontâneo da decisão e na utilização de todos os estratagemas possíveis, processuais ou não, para deixar de acatar o decidido.
Já a perspectiva da mediação é diferente.
Esse método, que se pauta pela informalidade e pela ampla autodeterminação das partes, permitirá que os reais motivos do conflito venham à tona.
A presença de um mediador devidamente capacitado e o ambiente propício ao diálogo empoderará as partes, vale dizer, as tornará mais cientes da situação conflituosa na qual estão inseridas, capacitando-as para que elas próprias encontrem a melhor solução para o caso. Exercendo esse protagonismo sobre o procedimento e sobre a solução do caso, é natural que os envolvidos no conflito tenham um comprometimento maior com o que decidirem.
Mas, é bom que se diga, a mediação não é a taboa de salvação para todos os problemas. É indicada para determinadas situações, como aquelas nas quais as partes mantêm ou mantiveram uma relação continuada, a exemplo dos sócios. Caberá ao advogado que assessorar as partes identificar se ela é realmente o método mais adequado para o caso que se apresenta.
Importante dizer também que a mediação implica menor desgaste emocional quando comparada ao processo judicial e à arbitragem. O fim da sociedade pode vir de forma de menos traumática, o que se traduz em grande vantagem para sociedade de advogados.
Ter um ex-sócio é muito melhor do que ter um atual inimigo. Ex-sócios não necessariamente têm de ser adversários. Pelo contrário, algumas firmas de advocacia vêm implantando políticas de aproximação e manutenção de relacionamento com os ex-sócios. Dessa forma, só têm a ganhar. O ex-sócio de ontem pode ser o parceiro de negócios de hoje.
Ademais, a imagem da banca junto ao mercado ou perante seus colaboradores internos é bem menos arranhada se o término da sociedade ocorrer de forma consensual, seja porque o procedimento é sigiloso, seja porque um processo judicial envolvendo o antigo sócio definitivamente não reflete bem junto aos ex-parceiros de trabalho que ainda permaneceram no escritório, podendo gerar clima de insegurança e de insatisfação.
Enfim, pode-se afirmar seguramente que as vantagens da mediação são muitas, sendo as acima mencionadas apenas alguns exemplos.
Não à toa a própria OAB/SP disponibiliza, em sua Câmara de Mediação, Conciliação e Arbitragem, mediadores para casos como esses. Nota-se, ainda, um visível aumento do número de câmaras privadas e de mediadores.
Quando usada nas hipóteses adequadas e por profissionais habilitados, a mediação pode ser altamente útil para dirimir controvérsias entre sócios advogados. Arrisca-se a dizer: a mediação veio para ficar e é um movimento que não tem volta.
Por Caio Eduardo de Aguirre, advogado sócio de Almeida Alvarenga e Advogados Associados. Mediador privado pelo IMAB. Especialista e mestre em direito pela PUC/SP.
Fonte: Migalhas, sexta-feira, 24 de junho de 2016